Dando seguimento ao projecto ENSINANDO UMA CRIANÇA A VIVER, que iniciou no dia 01 de Junho de 2014, em parceria com a Sehiarpo Associação e o Blog da Criança , trazemos mais uma historia para os nossos pequeninos, que tem como tema o direito a crescer em liberdade. Vamos ver a linda história que Marta nos conta abaixo sobre o direito de crescer em liberdade.
Marta e as palestras educativas no campus
Tema: Direito a crescer em liberdade
Hoje no campus de verão, fomos de excursão ao centro cultural da província, já que hoje havia palestras educativas ao longo do dia. Foi muito interessante, falaram de muitos temas nos quais muito poucas vezes pensamos, porque são muito habituais para nós, como o amor, a saúde, a tranquilidade e muitos outros. Mas houve um em especial que me fez pensar e refletir com cuidado: a liberdade. Uma das professoras dizia que na Europa não sabemos apreciar a liberdade nem o que é realmente. Cheguei a casa e enquanto me recolhia ao meu quarto, continuei a pensar nessas palavras e eu mesma me auto perguntava:
– Eu sou livre, não? Ninguém me impede de fazer coisas, desde que não fujam às normas da casa, respeite os outros e não prejudique a ninguém.
Bem, esta pergunta e algumas outras, rondaram a minha cabeça quase toda a tarde. Seguindo o meu horário, já era hora de meditar, para depois tomar um banho, preparar as coisas para o dia seguinte e ir para a cozinha, onde todas as noites ajudo o papá com o jantar. Pus a música do canto das baleias e fui meditar, escutando as gravações que mamã me tinha deixado. Sentei-me e iniciei o processo, mas não consegui meditar.
– Ena, não sou capaz de concentrar-me e atender as indicações de mamã – disse eu em voz alta.
Entristeceu-me não o ter conseguido fazer mas, a verdade é que essas palavras são como um eco na minha mente, que me geraram muitas perguntas sem resposta. Pensei que era um bom momento para tomar banho e tentar relaxar-me, porque assim os maus pensamentos iriam embora e dariam espaço para novas ideias, como habitualmente, mas desta vez, não funcionou. Papá chegou a casa e eu continuei silenciosa ajudando-o na confeção do jantar. O meu pai viu que algo de estranho me acontecia e perguntou-me:
– Marta, há algum motivo pelo qual estejas tão séria e calada?
– Papá, eu sou livre? Cresço em liberdade? Somos livres? – perguntei muito séria.
– Porque te questionas com isso, filha? – disse papá.
Então contei-lhe tudo o que tinha acontecido nas palestras e as dúvidas que me tinham surgido.
– Entendes papá? Com tudo o que ouvi, não sei realmente o que é a liberdade, se somos livres ou somente cremos que somos – continuei eu.
– Verás filha, melhor sentemo-nos para explicar-te devidamente este tema – disse meu pai – e continuou:
É certo o que ouviste nas conversas, filha. A liberdade tem um conceito diferente, segundo o continente ou a cultura em que vivemos. Nem todos podem ser livres como tu filha.
– Ah não? – disse eu.
– Não filha. Noutros países, as crianças não têm a possibilidade de crescer em liberdade como tu – disse papá.
– Eu não cresço em liberdade papá, tenho que obedecer-vos sempre, à mamã e a ti – disse eu.
Papá riu-se e continuou:
– É verdade, em casa, no colégio e inclusive na sociedade, há normas que devemos cumprir, mas elas não implicam que não cresças em liberdade, mas sim que possas crescer, sabendo como comportar-te, o que é o correto e crescer de forma civilizada, onde exista um respeito mútuo entre todos. Dizemos-te que deves ir à escola, porque é fundamental para o teu futuro, mas és livre de decidir o que farás com essa educação posteriormente. Ou seja, o que é que queres estudar futuramente. Não te forçamos a fazer coisas que não sejam boas para ti, mas damos-te a possibilidade de que escolhas entre diferentes alternativas que te complementem e que gostes. Futuramente, ninguém te diz quem deve ser o teu noivo, ou em que casa deves viver. Tens liberdade, segundo as possibilidades que tenhas ou o que tu sintas, de fazer eleições. Entendes filha? És livre, porque apesar de cumprir uma série de normas necessárias, tens a liberdade de pensamento e de ação para fazer aquilo que queiras e construir um futuro, em relação às tuas atitudes e ações. É um dom maravilhoso do que podes disfrutar. Em contrapartida, nem todas as crianças têm essa possibilidade. Existem países onde as crianças não podem ir à escola, nem sequer têm a possibilidade de o considerar ou pedi-lo a seus pais, porque são obrigadas a utilizar armas ou a participar em guerras. Eles não têm a possibilidade de crescer em liberdade.
– Não sabia papá – disse eu.
– Sim filha, existem muitos casos similares… há meninas que não têm a possibilidade de ir à escola, somente pelo facto de serem mulheres; outras só podem trabalhar em casa ou nos campos, e muitas outras coisas. Antigamente, em civilizações como a romana ou na época medieval, os casamentos eram pactos, ou seja, os pais decidiam com quem se iriam casar os seus filhos, e mesmo que não se amassem, eram obrigados a casar.
O que pretendo dizer-te filha, é que cada época em que vivemos, cultura, civilização ou país, atualmente vive uma liberdade diferente. És livre filha, cresces em liberdade, tendo a possibilidade de construir a tua vida, segundo o que o teu coração te diz. Ninguém te impõe nada que condicione a tua felicidade.
– Pois é – disse eu.
– Ser livre como um pássaro que decide que rumo tomar, é uma qualidade muito boa, mas não te esqueças que também implica responsabilidades – disse meu pai.
– Ah sim? Responsabilidades? Como pode ter responsabilidades disfrutar do direito a crescer em liberdade? – perguntei assombrada.
– Claro que sim Marta. Há muitas crianças que não têm a possibilidade de disfrutar do direito a crescer em liberdade, isso implica que temos o dever de aproveitá-lo e valorizá-lo como um presente muito especial. Gozar deste direito implica cuida-lo e não utiliza-lo para prejudicar a ninguém ou destruir o nosso caminho, empregando a liberdade a fazer coisas sem fundamento ou sem proveito para ti ou para a sociedade. Ser livres nos dá a opção de escolher entre o bem e o mal, mas seja qual for a escolha, terá consequências, por isso a liberdade implica responsabilidade.
– Já entendi papá – disse eu com ar mais tranquilo – e sabes uma coisa? Pediram-nos para fazermos um trabalho final de estadia no campus. Creio que o farei sobre a liberdade. Não sobre a que nós temos, que essa é bonita, mas sobre a que me contaste papá. Eu não sabia que havia crianças no mundo que, para além de passarem necessidades, não tivessem poder de escolha nas suas vidas. Se calhar há mais crianças que também não o sabem.
– Parece-me muito bem filha, é importante que todos tenham consciência do alcance da liberdade, no sentido mais amplo da palavra.
Trabalhei muito entusiasmada na redação final, que consistia no que nos tinham pedido, e senti-me orgulhosa por ter conseguido transmitir tudo aquilo que o meu pai me tinha clarificado e ensinado. A minha tarefa terminou com uma frase na qual tentei resumir o que significa para mim a liberdade:
“ Crescer em liberdade implica ter a consciência necessária para pensar e atuar conforme a nossa vontade e no que cremos ser correto. Toda a atitude tomada livremente, seja boa ou má, tem uma consequência, por isso devemos respeitar o direito a crescer em liberdade.”
Sehiarpo Associação
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